sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Telemarketing, pragmatismo e o mundo moderno

O mundo moderno é um mundo muito estranho. É estranho porque, por algum motivo misterioso, confiou demasiadamente no homem, ao ponto de acreditar que esse mesmo homem fosse capaz de criar um mundo, no dizer dos revolucionários franceses, cheio de liberdade, igualdade e fraternidade. Mas apesar de todas as promessas de um mundo melhor, tudo o que os liberais precursores da revolução conseguiram criar foi o Call Center. O call Center sim é aquilo que mais consegue caracterizar o nosso mundo, muito mais que qualquer fantasia otimista que qualquer iluminista jamais sonhou.

Todo mundo que foi atendido por um operador de telemarketing sabe o que esperar: informações desconexas e imprecisas e um precioso desperdício de tempo tentando obter informações sobre produtos que não precisa de uma pessoa que na maioria das vezes não entende do que está falando. Mas calma, não culpem o pobre operador. Não o culpem, pois a sua incapacidade de fazer o que deveria é uma conseqüência direta de um trabalho ultrajante, mecânico, sem graça, e humilhante. Afinal de contas, por melhor que seja o call Center, ninguém gosta de ser pago para ser xingado por não poder resolver problemas que não causou. Em outras palavras, fora um ou outro gesto de solidariedade que os operadores mostram um pelo outro, a existência do call Center no mundo é um claro sinal de que a liberdade e fraternidade, tal almejada pelo revolucionário francês, não aconteceu; ou pelo menos não como o povo que tomou parte na revolução esperava.

Que o telemarketing é um trabalho maçante é um truísmo. E também é um truísmo o fato dele ser necessário ao funcionamento do nosso mundo. Mas é justamente o fato dele ser necessário ao nosso mundo que o torna curioso. Ele é a prova de que o mundo que o homem criou é um mundo de cabeça para baixo. Se não, vamos pensar um pouco: criamos uma sociedade que tem no consumo de massa o motor do seu funcionamento. Num mundo em que produtos e serviços são oferecidos massivamente e as empresas devem oferecer o atendimento necessário a massa consumidora, o surgimento de uma central de atendimento telefônico pronta para prestar atendimento para todos os consumidores daquele produto é mais um truísmo.

Esse quadro também aponta para uma outra verdade, essa sim assustadora: os homens modernos só criam aquilo que é útil para o funcionamento do daquilo que criam. O moderno racionalista criou um mundo não de homens livres, mas de uma massa assalariada que, para fazer a economia girar, deve consumir uma série de bugigangas de valor altamente questionável. Como foi digo, no mundo criado pelos modernos, o Call Center é necessário. Ora, se algo degradado como o Call Center é necessário para o funcionamento do mundo, então é o que está realmente degradado é o mundo.

Isso nos leva a pensar no tipo de mundo que estamos criando. Um mundo onde a lógica fria do pragmatismo não nos leva a refletir criticamente se é isso que realmente queremos para nós ou se o mundo que estamos criando é realmente o que satisfará nossas necessidades reais. Afinal, que tipo de liberdade, igualdade e fraternidade pode existir num mundo em que, para satisfazer necessidades que muitas vezes não são necessárias, prende-se uma pessoa a uma mesa com um telefone que não para de tocar, com um trabalho incapaz de desenvolver sua intelectualidade e capacidade? Por que precisamos de um mecanismo que muitas vezes tudo o que faz é causar perda de tempo e descontentamento para quem quer ver seu produto ou serviço funcionando corretamente? Será que esse mundo é realmente necessário?

Mais de que um mundo onde o simples pragmatismo,que não vai além das necessidades imediatas do próprio mundo criado, precisamos raciocinar se o mundo criado pelo homem é realmente um mundo em que vale a pena se viver. Que tenhamos esse senso crítico.

Um comentário:

  1. Ricardo Rocha: boa noite mano!

    Conheci o seu blog através de seu recente comentário no blog do pastor Ciro. Eu também compactuo com as suas idéias.

    Abraço,

    Oseias Balzaretti Ferreira

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